PENSAMENTOS, DEVANEIOS E INQUIETAÇÕES

CRÔNICAS DO COTIDIANO, DO PONTO DE VISTA FEMININO,ARTÍSTICO, FILOSÓFICO, EMOCIONAL E SOCIOLÓGICO.

QUEM SOU EU...

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São Paulo, SP, Brazil
SOCIÓLOGA,HISTORIADORA, EDUCADORA E ARTISTA PLÁSTICA. Sou buscadora e curiosa por natureza. Sou bruxa, sem poções e crendices infundadas, observo e me integro à terra e aos seus movimentos. Amo a vida, os animais, plantas e a natureza. Solitária por vocação, pois nela busco forças e encontro repouso. Avessa aos ritos impostos e às convenções sociais, procuro a minha verdade. Sou arisca e desprezo dogmas, eles são a perdição da humanidade. Sou humana e falível. Busco o melhor de cada crença. deletando as manipulações. Amo o silêncio, a força da natureza e o equilíbrio cósmico, acho que sou inqualificável... Sou real e palpável, mas também sei ser etérea e indecifrável, se me convier. Amo o conhecimento, o mistério, as brumas da sensibilidade. Se quiser me conhecer melhor, siga-me...

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Minhas postagens são resultados de pesquisas na internet, caso houver algum artigo sem os devidos crédito, por favor me notifiquem para que eu possa corrigir uma eventual falta.
Obrigada por sua visita.

26 novembro, 2010

POLACAS - A TRAJETÓRIA DE MULHERES VALENTES E ESQUECIDAS

    Uma pequena homenagem á essas mulheres que, vilipendiadas, parias de uma sociedade injusta e hipócrita, lutaram, amaram, sofreram e, acima de tudo, mantiveram uma unidade de ideais, solidariedade e esperança.Meu respeito e profunda admiração por elas. Resgate do passado:
     A vida das prostitutas judias russas, alemãs e austríacas, as polacas que invadiram o Brasil no século passado , renasce em livros, peças e conferências, mas também nos seus túmulos, que são restaurados em CubatãoMoisés Rabinovici: As polacas estão ressuscitando, párias em vida, abandonadas por 30 anos no gueto em que se enterraram judias, em Cubatão, elas começam a renascer dos túmulos restaurados até Junho pela Sociedade Cemitério Israelita de São Paulo, já personagens de quatro livros. estrelas de três projetos teatrais; tema de monografia, tese e conferências; e fantasmas atormentando a comunidade judaica brasileira, dividida entre apenas reconhecê-las, ou enfim aceitá-las, ou enterrá-las para sempre.As polacas do "povo da Bíblia" estavam confinadas ao Deuteronômio: "Não haverá dentre as filhas de Israel quem se prostitua no serviço do templo, nem dentre os filhos de Israel haverá quem o faça" (23:17) Elas agora parecem ressurgir em outro momento bíblico: "Toma a harpa, rodeia a cidade, ó prostituta, entregue ao esquecimento; toca bem, canta muitos cânticos, para que haja memória de ti" (Isaías, 23:16).Certidão - Um "aluvião de Messalinas" invadiu o Rio de Janeiro em 1872. "A horda de judias russas, alemãs e austríacas começou a aparecer na roda cortesã, nos teatros de última classe, nas ruas mais concorridas, mulheres de ade manes desembaraçados, rostos formosos, trajando com luxo e levando presa no olhar a atenção dos transeuntes que as observavam", como registrou Os Cáftens, um folheto de Clímaco dos Reis, considerado pelo diretor do Museu Histórico em 1955, Gustavo Barroso, "a certidão de nascimento" da prostituição de porta aberta inaugurada pelas "famosas polacas". Elas "paravam nas esquinas, nos corredores e jardins dos teatros, em toda parte e, com uma desenvoltura até então desconhecida, distribuíam bilhetes com seus nomes e moradias..." O Estado de 25 de Julho de 1979, então A Província de São Paulo, publicou a notícia de que "duas alegres raparigas deliberaram dar algumas voltas na cidade em um elegante carrinho particular de passeio, tirado por um cavalo, e guiado por uma d'ellas, de nacionalidade russa, ao que ouvimos contar, e entendida n'aquellas façanhas hippicas".Uma verdadeira "cena", como acrescentou: "Assim fizeram, percorrendo galhardamente algumas ruas da cidade com grande espanto dos basbaques em geral, e dos urbanos em particular". Nas ruas da Liberdade ("ironias do acaso!"), as duas foram presas e levadas ao chefe da polícia, que as libertou "provando que aqui no Brasil, como na Rússia, é permitido à mulher guiar um carro particular".Os "biombos-alcouces" e "casinhas-bordéis" proliferaram rapidamente no começo do século no Rio e em São Paulo. "Neles, há um só quarto, uma só prostituta e um pequeno pátio, onde os homens que esperam formam fila", descreveu o jornalista Robert Neumann, autor de um livro de investigação sobre o tráfico de brancas, 23 Mulheres, publicado no Brasil em 1941. "Abre-se a porta e aparece a mulher, vestindo camisa de cores berrantes", ele continua. "O freguês que foi despachado passa sem lhe dizer palavra; e o próximo entra, a porta se fecha". Atónito, conclui: "Tão incrível é o número de fregueses recebidos num único dia que, antes de o revelar, necessário se faz dizer que ele foi confirmado pelas autoridades, pela sociedade judaica de socorros Ezras Noshim e pelos investigadores da Liga das Nações".Historiadora da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Margareth Rago "morreu de medo" ao penetrar no mundo misterioso das polacas e de seus rufiões para o livro Os Prazeres da Noite: Prostituição e Códigos da Sexualidade Feminina em São Paulo, 1890-1930 (Paz e Terra, 1991). "Fui assustada por gente da comunidade judaica que não queria desenterrar o assunto." Perguntavam-lhe: "Mas por que você quer mexer com isso?" Ao saber agora das obras de restauro no cemitério de Cubatão, ela se mostra curiosa e irônica: "Redenção?" Rago foi muito além da "geografia do prazer" no submundo de São Paulo. Seguindo o rastro deixado há 50 anos no livro Le Chemin (O Caminho) de Buenos Aires, pelo poeta e famoso repórter Albert Londres, queimado como um arquivo num suspeito incêndio de um navio em 1932, ela identifica no Brasil os tentáculos dos poderosos "maquereaux", os gigolôs franceses, e dos "polaks", traficantes de judias das aldeias pobres do Leste Europeu.  Máfias - Quando perseguidos na Argentina, os rufiões refugiavam-se nas filiais Paulista ou Carioca, onde mantinham até "escolas de prostituição". As máfias francesa e polaca importariam para a América do Sul cerca de 1.200 mulheres por ano, embarcadas nos portos de Gênova, Marselha, Anvers (N.E.: Antuérpia)e Hamburgo (N.E.: respectivamente portos da Itália, França, Bélgica e Alemanha). Mas "é praticamente impossível estimar a quantidade de prostitutas que vieram traficadas da Europa", conclui Rago. Como "também dificilmente saberemos quantas vieram por vontade própria, ou iludidas com promessas de casamento e perspectivas estimulantes de enriquecimento". Nos bordéis distinguiam-se as estrangeiras, "embora as raras estatísticas disponíveis registrem uma percentagem superior de brasileiras". Madame O, de 80 anos, testemunhou a belle époque paulista como costureira francesa. E nunca encontrava brasileiras nos bordéis."Por quê?", perguntou-lhe Rago, numa entrevista em 1989. "Porque elas não eram disso no meu tempo", respondeu. "Quando cheguei ao Brasil, não havia mulheres (brasileiras) não... tudo francesas e polacas, muitas". Na música de João Bosco e Aldir Blanc, O Mestre-Sala dos Mares, de 1974, as mulatas já se tornam maioritárias:...Foi saudado no porto pelas mocinhas francesas e por batalhões de mulatas. Está no Gênese (38:24): "Passados quase três meses, disseram a Judá: 'Tamar, tua nora, se prostituiu e eis que está grávida da sua prostituição.' Então disse Judá: 'Tirai-a para fora, e seja ela queimada.'" Está em Levítico (21:9): "E se a filha dum sacerdote se profanar, tornando-se prostituta, profana a seu pai; no fogo será queimada".Os judeus brasileiros não queimaram as "curves" (prostitutas, em iídiche) de Santos, do Rio e de São Paulo. Mas lhes reservaram, "impuras", o mesmo chão dos suicidas que ousam findar a vida dada, e então só tirada, por Deus: junto aos muros dos cemitérios. "Die linke", esquerdistas, marginalizadas, ou "as outras", na tradução do jornalista Alberto Dines, as "curves" abriram seus próprios cemitérios, rezaram em sinagogas próprias e congregaram-se em sociedades de assistência mútua. Viveram e morreram judias. Mais do que esquecidas, expiaram. Abolidas, perpetuaram-se.  Eternas polacas .Por  alguns anos estudei a história de um grupo de imigrantes judeus em algumas cidades do Brasil e mesmo fora dele. Por curiosidade fiz as contas e percebi que fazem doze anos que me sinto debruçada e envolvida por essas trajetórias. Refiro-me as moças judias prostitutas que ficaram conhecidas como polacas. Meu trabalho foi também uma caminhada envolta em paixão. Enamorei-me por essas narrativas e desejei muito que um trabalho acadêmico pudesse interferir e transformar uma dada realidade. De muitas maneiras, posso dizer que carrego, orgulhosa essa glória, dividida certamente com muitos que pelo caminho também se apaixonaram por elas. Quando comecei a pesquisa, em 1988, era um tabu mencionar essa história. Outros tempos vivemos hoje felizmente, e me sinto muito gratificada por não ter desistido, ideia que sempre se mostrou para mim muito longínqua.Em um país que editar uma tese já é um milagre, fazê-la um agente transformador é algo inominável. A cada palestra que era convidada a falar sobre as polacas, sublinhava o estado lastimável dos seus cemitérios e descortinava um passado, obrigando os que me ouviam a adentrar em um espaço envolto por mistérios e segredos desnecessários. Assim, em 1997 eu escrevi um artigo para o jornal Paulista Resenha Judaica, sobre a restauração do cemitério israelita de Cubatão, que ficou três décadas abandonado e pertenceu à Sociedade Beneficente e Religiosa Israelita de Santos (SBRI deSantos),  e foi restaurado pela Sociedade Cemitério Israelita de São Paulo Chevra Kadisha, em cooperação com a Prefeitura de Cubatão. Ali estão enterrados cerca de 15 homens e 60 mulheres de origem judia que tiveram como ofício a prostituição e a cafetinagem no baixo meretrício santista, onde atuaram até a década de 1960.Dois anos depois, em 1999, o presidente da Chevra Kadisha, Marcelo Kochen, me convidou a ajudá-lo a colocar os nomes nas lápides das polacas que estão no Cemitério Israelita do Butantã. Isto porque, no fim dos anos de 1960 as sócias daSociedade Feminina Religiosa e Beneficente Israelita (SFBRI), já idosas e sem poderem cuidar umas das outras, transferiram as sócias asiladas na entidade para o lar dos velhos da comunidade judaica de São Paulo, no bairro de Vila Mariana. 
  • O cemitério com Santana e inaugurado em 1928 foi desapropriado no início da década de 1970. O estado de abandono, a ausência de responsáveis pela SFRBI e as necessidades do cemitério católico ao lado, definiram esse ato. Pelos dados do departamento de Cemitérios da Prefeitura de São Paulo, haviam ali 233 corpos enterrados. Vinte e quatro desses foram reclamados por familiares, sendo dezoito transferidos para o Butantã e seis para cemitérios católicos na cidade. O restante foi colocado em fileiras de lápides sem identificação na quadra 136 do setor "N" do Cemitério Israelita do Butantã. Essa situação permaneceu por vinte e sete anos.No dia 27 de Fevereiro de 2000, a meu pedido, realizou-se naquele cemitério uma reza: a inauguração das lápides das sócias da SFBRI. O hazan David R. Hullock e depois o rabino Henri Sobel comandaram esse ato religioso. Ou seja, vinte e sete anos depois cada uma das mulheres e homens enterrados naquela quadra receberam nas suas lápides o seu nome e a sua data de falecimento. Sempre imaginei que esse seria o ponto final do meu trabalho, o resgate material daquelas identidades. Mas percebi que não há atos isolados. Ao assentar os nomes completos nas lápides, pode-se conhecer uma faceta de suas identidades. Entretanto essa não se esgota nesse ato e não nos faz conhecê-los. A única forma de tê-los um pouco mais completos é mergulhando nas suas histórias .Nomear, conhecendo, é de outra ordem. Assim, creio que a investida deve se preocupar menos com a "lista de nomes" e os possíveis sobrenomes conhecidos. A glória ou não de muitos ao verem o seu "nome de família" ou o de um amigo ali e ficar preso a esse dado é não ter, infelizmente, a grandeza de espírito para inclinações mais densas. O nome naquelas lápides não é um ato de curiosidade para os vivos que ali vão olhá-los. É sim um presente póstumo para quem ali está. Em cada lápide, não se esqueçam, há os restos de um corpo, de uma história, de uma vida.Na história da minha história em busca das polacas encontrei narrativas que falavam de seres humanos e suas vivências dos percalços e das alegrias do dia-a-dia. O mais bonito, certamente, é que para onde emigraram, fundaram sociedades que mimetizavam o mundo judaico do qual estavam alijadas. O lema da sociedade carioca fala por si. Eram as irmãs dos Cheised chel emes: da caridade de verdade, aquela que não deseja recompensa. Nessas horas me lembro sempre de dona Rebecca, a última polaca carioca que morreucom103anos em 1984. 
  • Em uma conversa com o jornalista Zevi Ghivelder ela afirmou saber que era fruto de uma circunstância e soube vivê-laO meu desejo de trazer a história desse grupo e de, principalmente, deixá-los falar, passou necessariamente por escolhas difíceis. Meu compromisso foi sempre o de respeitar as suas vontades. Seguindo esta trilha, não há codinomes em meu trabalho, como também agora não existem identidades arrancadas nas lápides do Butantã. Isto porque, elas também não usavam nomes falsos Assinaram em todas as atas das suas sociedades de ajuda mútua que vi, das diferentes sociedades que analisei, os seus nomes completos. No Rio, quando casavam, muitas vezes com não judeus, acrescentaram aos seus nomes o sobrenome do amado, de maneira clara. Em São Paulo, se contraíram matrimonio fora do grupo religioso, continuaram a identificar-se com os seus nomes e sobrenomes judaicos.Mas conhecer suas identidades só faz sentido quando sabemos de quem estamos falando. Mais do que nomes ao vento, histórias de vida. Pelo meu desejo sincero de ter podido contribuir para esse conhecer, gostaria de concluir com as palavras do rabino Sobel na reza do dia 27 de Fevereiro, torcendo que estas sejam palavras proféticas:
  • "Rezamos hoje  'El malê rachamim'  em memória das mulheres sepultadas nesta área. Que cada uma delas descanse em paz

    ."


Um comentário:

Felícia Campos disse...

Falta a citação das suas fontes!!!
Muito legal a coletânea de informações a respeito. É um tema realmente encantador.

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